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sábado, 2 de fevereiro de 2013

Ickbarr Bigelsteine

Quando eu era pequeno, eu tinha muito medo do escuro. Eu ainda tenho, mas quando eu tinha mais ou menos seis anos, eu não conseguia passar uma noite inteira sem chorar até que um dos meus pais viessem ao meu quarto para olhar de baixo de minha cama ou dentro do meu armário por qualquer monstro que fosse que estivesse escondido esperando para me comer. Mesmo com abajur, eu continuava a ver vultos se deslocando pelo meu quarto, ou rostos estranhos me observando pela janela do meu quarto. Meus pais davam o seu melhor para me consolar, que era apenas um pesadelo ou uma ilusão da luz, mas na minha cabeça infantil eu estava certo que no segundo que eu adormecesse, as coisas malvadas viriam me pegar. Na maioria das vezes eu apenas me escondia de baixo das cobertas até ficar tão cansado que caía do sono, mas de vez em sempre eu entrava em pânico com tanto vigor que eu ia correndo e gritando até o quarto de meus pais, acordando meu irmão e minha irmã no processo. Depois dessas situações, não tinha jeito de ninguém ter uma noite inteira de descanso.

Eventualmente, depois de uma noite traumatizante em particular, meu pais tinham tido o suficiente.
Infelizmente para eles, eles entendiam a futilidade de argumentar com uma criança de seis anos de idade e sabiam que eles não conseguiriam me convencer de me livrar dos meus medos infantis pela razão ou pela lógica. Eles tinham que ser espertos.
Foi ideia da minha mãe costurar um amiguinho para dormir comigo.

Ela juntos vários pedaços aleatórios de tecido e junto com sua máquina de costura ela criou o que eu chamaria posteriormente de Sr. Ickbarr Bigelsteine, ou apenas Ick para encurtar. Ick era um monstro de meia, como minha mãe o chamava. Ele era bastante assustador, tenho que admitir. Honestamente, olhando para trás agora eu estou impressionado que minha mãe conseguiu criar algo tão estranho e perturbador. Ickbarr tinha as suas costuras fazendo-o parecer um gremlin Frankenstein, com grandes olhos de botão branco e orelhas caídas de gato. Seus pequenos braços e pernas eram feitos de pares de meia listrado branco e preta da minha irmã, e metade de seu rosto era verde feito das meias de futebol do meu irmão. Sua cabeça podia ser descrita como em forma de lampada, e sua boca era um pedaço de pano branco costurado em zig zag para formar algo que parecesse com dentes afiados. Eu o amei de primeira.

De começo, Ick nunca saia de perto de mim. Muito menos depois do escurecer, é claro. Ick não gostava do sol, e ficava chateado se eu tentava leva-lo à escola comigo. Mas estava tudo bem, eu precisava dele somente a noite para manter o bicho-papão longe, no que ele era muito bom. Então toda a noite, Ick me falava onde os monstros estavam escondidos, e eu o colocava no local que ele tinha indicado, perto dos monstros. Se algo estava no armário, Ick bloqueava a porta. Se era uma criatura negra arranhando minha janela, Ick ficava contra o vidro. Se era uma gigante besta peluda de baixo da minha cama, então de baixo da cama ele ficava. As vezes os monstros não estavam nem no meu quarto. As vezes eles estavam escondidos nos meus sonhos, e Ickbarr tinha que entrar dentro dos meus pesadelos. Era divertido trazer Ick para meu mundo dos sonhos, ele passava horas lutando com demônios e fantasmas. A melhor parte era, que nos meus sonhos, Ick podia falar comigo de verdade. "O quanto você me ama?” Ele perguntava.
"Mais do que qualquer coisa no mundo." Eu o falava sempre. Uma vez em um sonho, depois de eu ter perdido meu primeiro dente, Ick me pediu um favor.


"Posso ficar com seu dente?”

Eu perguntei porque ele o queria.

"Para me ajudar a matar as coisas ruins." Ele disse.

Na manhã seguinte na hora do café, minha mãe perguntou aonde meu dente tinha ido. Pelo o que ela tinha dito, a fada do dente não o tinha encontrado debaixo do meu travesseiro. Quando eu falei para ela que eu tinha dado para Ickbarr, ela apenas deu os ombros e voltou a alimentar minha irmãzinha. Daí em diante, toda vez que eu perdia um dente, eu o dava para Ickbarr. Ele sempre me agradecia, claro, e me dizia que me amava. Eventualmente, eu parei de ter dentes de leite, e comecei a ficar um pouco velho para ficar brincando com bonecos. Então Ick estava na minha prateleiras de livros empoeirada, perdendo minha atenção lentamente.

Entretanto, com o tempo, meus pesadelos ficaram piores. Tão ruins que eles começaram a me seguir no mundo real, me aterrorizando em cada canto escuro ou escondidos em arbustos. Depois de uma noite ruim voltando de bike da casa de um amigo meu, eu jurei que um bando de cachorros raivosos estavam me caçando, e eu voltei para casa para achar uma coisa estranha me esperando em meu quarto. Lá, em minha cama, de pé com um brilho suave da lua batendo em si, estava Ickbarr. De primeira achei era apenas meus olhos pregando outra peça em mim, era noite, então eu tentei ligar a luz. Liguei e desliguei no interruptor várias vezes mas a escuridão permanecia. Foi aí que comecei a ficar nervoso.

Eu recuei vagarosamente tentando sair pela porta atrás de mim, meu olhos nunca deixando a sombra da silhueta de Ick, minha mão desjeitosamente atrás da minhas costas tocando a batente da porta. Eu estava pronto para sair correndo dali quando ouvi a porta batendo e fechando, me trancando na escuridão. No nada além de sombras e silêncio, eu fiquei travado no mesmo lugar, não conseguia nem respirar. Por quanto tempo eu não sei dizer, mas depois do que eu achei ser o tempo de uma vida,eu ouvi um som, uma voz familiar.

"Você parou de me alimentar, então porque eu devia te proteger?”

"Me proteger do que?”

"Deixe-me te mostrar."

Eu pisquei uma vez, e tudo tinha mudado. Eu não estava mais no meu quarto, eu estava em outro.... lugar. Não era o Inferno, mas não era muito diferente disso. Era tipo uma floresta, um lugar horrível, de dar pesadelos onde partes de embriões abortados eram pendurados nas copas das árvores, e o chão era infestado de insetos carnívoros. Uma grossa névoa flutuava no ar com um fedor de carne podre, enquanto raios carregados cruzavam o céu da noite. Ao longe eu conseguia ouvir o grito agonizante de algo não humano. Minha cabeça pulsava como se fosse explodir, a dor me forçando meus olhos chorar como cachoeiras. Na minha mente, eu ouvia a voz dele novamente.

"Isso é o que sua realidade se tornaria sem mim."

Eu senti a terra tremer enquanto sentia pegadas se aproximando rapidamente.

"Eu sou o único que pode parar isso."

Estava atrás de mim agora, enorme e raivoso, o respirar quente na minha nuca.

"Me de o que eu preciso, e eu vou."

Eu acordei antes de poder me virar.

No dia seguinte eu invadi o armário de meus país procurando pelos dentes de leite da minha irmãzinha, e dei todos para Ickbarr. Quase imediatamente as noites de terror acabaram, e eu conseguia mais ou menos continuar com minha vida normalmente. De tempos em tempos eu tinha que ir no quarto da minha irmãzinha e roubar o que era destinado à fada do dente, ou estrangular o gato de algum vizinho e arrancar os pequenos dentes incisivos. Qualquer coisa para me manter longe das visões, qualquer coisa entre dentes tubarão arrancados de um colar ou dentes de animais pequenos. Eu também comecei a notar que Ick passeava no meu quarto quando eu o deixava por qualquer período de tempo, reorganizar minhas coisas e cobria algumas coisas. Ele estava até começando a parecer mais realista, de alguma forma. Na luz certa seus dentes pareciam brilhar, e ele era quente ao toque. Por mais que ele me assustava, eu não conseguia juntar coragens de simplesmente destruí-lo, sabendo perfeitamente bem em que situação isso me deixaria. Então eu fui na coleta de dentes por Ick por toda a escola e na faculdade. Quanto mais velho eu fico, mais coisas que eu temo, mais dentes são necessário para Ick me manter seguro.

Agora tenho 22 anos, com um trabalho decente, meu próprio apartamento, e um conjunto de dentaduras. Faz quase um mês desde a última refeição de Ick, e o terror está começando a me cercar novamente. Eu tomei um desvio para a garagem depois do trabalho nessa noite. Encontrei um homem atrapalhado com sua chave do carro. Seus dentes estavam amarelados de uma vida inteira de café e cigarros. Mesmo assim, eu tive que usar um martelo para arrancar os molares. Quando voltei para meu apartamento, ele estava me esperando. No teto, na quina da parede. Dois olhos brancos e dentes de navalha.

"O quanto você me ama?” Ele perguntou.

"Mais do que tudo" Eu falei, tirando meu casaco.

"Mais do que tudo no mundo."

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