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quinta-feira, 13 de junho de 2013

Noite Maldita


Finalmente o dia 31 de outubro havia chegado aquele ano e mesmo que o Halloween não fosse um dia com muito prestígio no país, André sempre ficava animado com a chegada desta data todos os anos. Gostava de comemorá-la pelo fato de seu aniversário ser apenas alguns dias antes e sempre gostou de tudo que fosse relacionado à terror. A forma que a celebrava não envolvia nada de especial, apenas alugava alguns filmes para se sentir no clima e depois iria dormir, mas naquele ano tudo seria diferente.

No final da tarde havia passado em uma locadora, pois era uma das raras pessoas que preferia o jeito antigo e tradicional ao invés de assistir pela internet, e pegou três filmes, dois os quais já havia assistido e outro que o atraiu pelo nome, que indicava ser algum filme B, e André gostava de conhecer filmes novos mesmo que fossem ruins. O filme estava dentro de uma capa preta que continha apenas escrito “Halloween” na parte de cima. Imaginou que se tratava de uma cópia barata do filme original e como a data combinava com o título, decidiu alugá-lo. Outros dois fatores que o animara, foram que o filme não continha nenhum informação para se ler e ninguém da locadora sabia sobre ele, era como se tivesse aparecido do nada por lá.

Esperou a tarde da noite chegar para que não houvesse nenhum barulho na rua nem nas casas vizinhas e como morava sozinha e era uma sexta-feira, não precisaria se preocupar em acordar cedo no dia seguinte como fazia todos os dias da semana, então começou sua pequena maratona do medo. Já havia assistido os dois primeiros inúmeras vezes (A Profecia e Psicose, ambos eram antigos, porém ícones do terror) e mesmos sabendo tudo o que acontecia, adorava assisti-los e imaginava que jamais iria se cansar disso.

Na hora em que terminou de assistir os dois já estava cansado e eram as primeiras horas da madrugada, mas precisava assistir ao terceiro filme, se sentiu atraído a fazê-lo durante a noite toda e foi o que fez, mas logo depois se arrependeu de ter entrada justamente naquela locadora naquela tarde.


Após colocar o DVD a imagem ficou escura alguns segundos até surgir uma frase em uma cor vermelha forte, escrito em uma fonte que dava a entender que representava sangue pingando de algum lugar com as simples palavras: “Essa noite você irá morrer.” Apenas de ler essa frase André ficou ainda mais empolgado em assistir, se esquecendo completamente da canseira que sentia há pouco, mas alguns minutos depois mudou sua opinião.

O filme era preto e branco sem áudio e parecia ser apenas um curta-metragem. Inicialmente a câmera mostrava um homem negro com o rosto um pouco deformado, mas que não chegava a ser um “monstro” do filme; vestia uma camisa xadrez vermelha e branca, que parecia estar suja de terra e mais alguma coisa, dirigindo um carro ao que parecia estar em alta velocidade e junto ao banco de passageiro estava um machado sujo igual às roupas do homem.

André começou a ficar intrigado quando a câmera saiu de dentro do carro e mostrou-o passando por uma rua muito parecida com a sua e estacionando o carro logo a frente de uma casa muito parecida também, mas mesmo assim continuou a assistir. A cena continuava com o homem descendo do carro tranquilamente segurando o machado na mão esquerda e logo em seguida usando-o, dando seis golpes seguidos lentamente um dos outros, para quebrar a porta de madeira que dava entrada para a sala e obviamente aquele homem estava à procura de alguém na casa.

Sentiu que já havia assistido muita coisa para uma noite e estava apavorado o suficiente para terminá-lo, então decidiu terminar com o Halloween e esperar mais 365 dias para o próximo. Desligou o aparelho de DVD e sua televisão e subiu as escadas até chegar ao seu quarto e poder dormir tranquilamente para esquecer o que havia acabado de assistir, e mesmo sem saber como terminava, também não possuía o menor interesse em descobrir.

Quando abriu os olhos imaginou que o sol já estivesse o iluminando o céu e seria apenas mais um dia para relaxar, quem sabe assistir a outro filme, não necessariamente de terror, mas quando olhou para o relógio digital em cima de seu criado mudo logo ao lado da cama, viu que ainda eram três da manhã e que na verdade havia acordado com um barulho vindo da rua, parecido com o de um carro ao longe e se aproximando cada segundo mais. Permaneceu deitado tentando voltar a dormir até o momento em que o ouviu parando na frente de sua casa, ou senão em alguma casa vizinha.

Havia acabado de acordar e não conseguia pensar em nada direito, apenas o quanto desejava dormir novamente, mas quando ouviu um forte barulho na porta de sua sala, tudo fez sentido instantaneamente e se levantou da cama em menos de um segundo. Não era possível estar acontecendo o que imaginava e também não se tratava de um pesadelo, pois agora estava o mais acordado possível. Outra pancada na porta sete segundos depois.

Deu uma olhada rapidamente em sua janela, aonde era possível ver a porta da casa logo abaixo, e o mesmo carro do filme estava estacionado; também conseguia ver um pouco do homem que queria entrar e era o mesmo homem. André estava no filme e segundo o próprio filme ele iria morrer aquela noite. O terceiro barulho na porta foi escutado. Restavam apenas mais três para ver o que o destino lhe reservava para a eternidade.

Pegou seu celular, que estava ao lado do relógio digital, e quando foi ligar para qualquer número de emergência que atendesse seu pedido de socorro, o celular estava sem sinal e com uma mensagem escrita em seu visor: “Esta noite você irá morrer.” Após ler a mensagem novamente nem se deu conta de que estava tremendo e nem ouviu a quarta machadada lançada à porta.

Tentou pensar no que fazer, mas não conseguia, o tempo era curto demais e logo o homem entraria e acabaria com a vida de André sem nenhum motivo aparente. Teve tempo apenas de se arrepender profundamente a ponto de quase chorar por ter ido naquela maldita locadora e ter achado o maldito filme. O quinto golpe se fora e agora restavam alguns segundos até tudo estar terminado.

Restavam apenas mais alguns segundos, então saiu de seu quarto e fechou a porta tomando o cuidado para não fazer barulho, não que importasse muito, mas era melhor se prevenir, e entrou na porta logo à frente que dava para o banheiro. O último golpe foi ouvido e era possível se ouvir os primeiros passos do homem dentro da casa.

Deu dois passos para trás em frente à porta já se preparando para o que iria lhe acontecer, mas quando deu uma breve olhada ao redor sentiu um raio de esperança surgir dentro de seu corpo. Pegou o pequeno espelho pendurado na parede em cima da pia e decidiu morrer se arriscando ao invés de morrer se lamentando. Não sabia como o filme terminava, não sabia se tudo o que estava acontecendo também aconteceria lá, mas nada disso importava, era apenas a luta pela sobrevivência.

Ficou encostado na parede ao lado da porta e pôde ouvir os lentos passos do homem a caminho do quarto, logo após ter terminado de ouvir os passos subindo as escadas. Sentia aquela horrível presença com uma pesada respiração chegando cada vez mais perto, e embora se imaginar meio agachado junto à porta segurando um espelho fosse meio patético, preferia isso a morrer a machadadas enquanto estivesse dormindo suavemente.

Os passos terminaram e quando ouviu a porta de seu quarto se abrindo, rapidamente abriu a porta do banheiro e junto com um grito bateu com o vidro na cabeça do homem, que era forte mas não era muito alto, e quando o observou caindo em cima da cama com vários pedaços de vidros fincados dentro de sua pele fazendo uma grande quantidade de sangue pingando, saiu correndo em direção à cozinha no andar de baixo.

Desceu as escadas, olhou para o que sobrara da portado lado direito e entrou na cozinha pelo lado esquerdo e pegou a primeira grande faca que encontrou, mas quando se virou novamente para a porta o homem estava lá. Como em um passe de mágica o homem apareceu parado de costas para a porta, segurando o machado com ambas as mãos e nesse momento André reparou que o homem era exatamente igual ao vídeo, com exceções da cabeça sangrando por causa do vidro e dos olhos negro e sem alma que ele possuía, detalhe que não percebeu quando viu ao filme.

André não contava mais com o espelho como arma, mas era uma faca contra um machado, e seu “ataque surpresa” já havia sido usado, tudo o que restava era contar com sua sorte que não estava em um bom momento.

Os dois ficaram se encarando por poucos segundos: André com uma expressão facial de puro medo e horror e o homem com uma expressão calma sem demonstrar nenhuma emoção. O homem começou a andar em direção a cozinha com a mesma lentidão que havia derrubado a porta da sala e andou até o quarto. André não sabia da onde diabos aquela calma surgia, mas sabia que não poderia ficar parado, então correu em direção ao homem, uma atitude que mais tarde perceberia que não fora das mais inteligentes.

Chegou próximo o suficiente para tentar cravar a faca em seu peito, mas o homem apenas afastou André com a parte de madeira do machado derrubando-o no chão e quando colocou a mão na pequena mesa de centro da sala para se apoiar e levantar, foi preciso apenas uma machadada forte e precisa para lhe arrancar a mão. Soltou o grito de dor mais alto de toda sua vida e conseguia sentir o que parecia ser litros de sangue saindo em jatos do lugar aonde ficava sua mão.

Mesmo com a mão decepada e uma grande poça de sangue se formando ao redor da mesa, André ainda segurava a faca com sua mão direita, a mão que “sobrevivera”, e no momento em que o homem se preparava para lhe arrancar a cabeça, conseguiu dar um impulso para sair do chão e enfiou a faca em seu pescoço com toda força que possuía no momento e depois começou a rasgá-la lentamente. Não conseguiu fazer um grande corte, chegou até aproximadamente ao meio do pescoço até o homem soltar o machado, o maldito machado, e começou a se afastar.

Era a maior quantidade de sangue que André havia visto até aquele dia que saia da garganta do homem. Ao mesmo tempo em que saíam jatos, também saía em uma espécie de “cachoeira”, e mesmo em seus últimos instantes de vida, o homem negro, e aparentemente sem alma, não esboçava nenhuma reação e não emitia nenhum som. Começou a ficar de joelhos com as mãos na garganta tentando, obviamente em vão, conter o sangue e não durou muito tempo, apenas cerca de meio minuto para que caísse de bruços no chão. André se levantou com cuidado, sua mão ainda liberava grande quantidade de sangue e precisava de um atendimento médico urgentemente, e observou o corpo do homem, que agora estava imóvel.

Enquanto André começou a caminhar lentamente em direção à porta da sala, viu o corpo que estava próximo aos seus pés começar a desaparecer lentamente, se transformando em uma fumaça escura, como se aquele homem fosse de areia ou algo do tipo, mas teve a certeza absoluta de que não era.

Quando finalmente chegou à rua seu corpo já estava começando a ficar branco e sentia muito frio, devido a grande quantidade de sangue perdida, e seus vizinhos já estavam saindo de suas casas, afinal, após todo o barulho da porta e espelho se quebrando junto com os gritos de dor algo totalmente anormal estava acontecendo. Sabia que o socorro estava a caminho e que ficaria a salvo, mesmo tendo que aprender a viver sem uma mão, mas só podia se lamentar em uma coisa: Jamais deveria ter entrado naquela maldita locadora no dia de Halloween.

Créditos: Rafa Magiolino

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